01 março 2017

Moeda «1 Real Bifacial»

Trata-se de uma moeda de 1 Real com dois anversos, ou seja, sem a imagem da Efígie da República, e com os dois lados mostrando o valor facial de “1 Real”.

Segue abaixo um vídeo em alta resolução dessa peça, de um colecionador do facebook, o qual salvei para meu canal do YouTube:



Vamos aos fatos:

A moeda de 1 Real com o atual design é fabricada desde 1998, (há 19 anos, portanto), e não há absolutamente NENHUM relato deste tipo de anomalia nos anais numismáticos brasileiros. Surgiu recentemente nas redes sociais - e sempre nas mãos de comerciantes de reputação duvidosa e outros ilustres desconhecidos nos meios numismáticos –, alguns pouquíssimos exemplares, geralmente com data 2008, (a de maior tiragem) e sempre à venda por valores estratosféricos. Infelizmente alguns amigos ficaram encantados e resolveram comprar tal peça.

Essa anomalia jamais me convenceu, porque são diferentes um do outro os encaixes dos cunhos de anverso e reverso na máquina de cunhagem da Casa da Moeda. Isto é feito justamente para que não ocorra que algum funcionário desatento encaixe na máquina dois cunhos de anverso ou dois cunhos de reverso, (e ocorram moedas com 2 lados iguais) e também porque um dos cunhos é móvel (bate as moedas), enquanto o outro é fixo.

Como algumas pessoas também questionaram esse fato, recentemente surgiu, também nas redes sociais, o BOATO de que “conversaram com técnicos da Casa da Moeda” (sem nomes, claro…) e “descobriram” que os encaixes dos cunhos das máquinas de cunhagem eram iguais até ocorrer o erro da moeda «50 Centavos sem o Zero», em 2012, e que, para “prevenir” que ocorra novamente, tornaram os encaixes diferentes, e isto “explicaria” o motivo pelo qual somente são encontradas moedas bifaciais com datas anteriores a 2012, e que somente após isto ocorrer, é que passou a ser “impossível” ocorrer tal erro. É um BOATO sem a menor fundamentação lógica e tampouco técnica (pois requereria a mudança da engenharia das máquinas de cunhagem, fabricação de novos cunhos com desenho diferente, etc), além do fato de que a anomalia “mule” não utiliza dois cunhos de anverso ou dois de reverso, e sim, um de anverso e outro de reverso, apenas trocando a denominação de um dos cunhos. Logo, esse BOATO é ridículo e ao invés de “esclarecer”, gerou ainda mais dúvidas acerca da veracidade deste tipo de peça.

Com fortes suspeitas sobre como poderia ter sido feito fora do ambiente da Casa da Moeda, passamos a silenciosamente investigar as peças que surgem e que são publicadas nas redes sociais.

Com a publicação do vídeo acima em alta resolução, ficou fácil perceber que esta peça é uma MONTAGEM, e de má qualidade. Penso que foi serrado fora o reverso (Efígie da República) da peça, cortado outro anverso (valor facial) de outra moeda, e em seguida colocado no lugar da efígie, utilizando solda. Retirei algumas imagens do vídeo acima, e podemos observar com cautela como pode ter sido feito. Observem a borda da peça:


Foto 1: Observar a diferença de cor entre a borda da parte de baixo da moeda, e a borda propriamente dita. São pátinas diferentes. Observar também a mossa na borda que “levantou” a “tampa” de cima da peça. Acredito que esta mossa foi causada atirando a moeda ao chão para desmontar as duas partes – núcleo e anel externo.



Foto 2: Borda extremamente irregular, não condizente com o padrão de qualidade da Casa da Moeda, além da “tampa” estar um pouquinho deslocada. Isso jamais ocorreria na cunhagem, pois a virola não deixaria a frente da peça extravasar pela borda.



Foto 3: Diferença de posição entre as “tampas”: a de cima está “deslocada para dentro”, enquanto a de baixo está “deslocada para fora”. Há uma clara divisão entre a tampa de cima e o miolo da peça, e é evidência de que uma das “tampas” não é original desta peça.



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Foto 4: A borda é completamente irregular, com uma fissura igualmente irregular, e variando em espessura (que não existe em moedas normais), e que demonstra claramente o corte e a solda.


Foto 5: É possível notar um leve desalinhamento das barras paralelas ao se comparar o núcleo com o anel externo, além de uma leve “mossa” – um buraco – entre ambos, acima do numeral “1”, o que evidencia que a peça foi desmontada e remontada novamente. Ampliem no vídeo para ver esse detalhe.


Fica a questão: É possível cortar as “tampas” de moedas e depois soldá-las em outra peça?

Há artesãos que fazem peças curiosas com moedas. Seguem exemplos em fotos e vídeos:


Assistindo a este vídeo, percebemos que não só é possível cortar com precisão qualquer parte da moeda que desejar, como o serviço é fácil e muito rápido. Em poucos minutos pode-se montar uma “1 Real Bifacial” bastando para isto serrar fora o reverso (efígie da república) de uma peça, e soldar outro anverso de outra peça no lugar.

CONCLUSÃO FINAL:

Deixo claro, sem a menor sombra de dúvida, e em letras garrafais, o seguinte:

PEÇA RECENTEMENTE FALSIFICADA
PARA ENGANAR O COLECIONADOR.


Atualização em 26 Dezembro 2017:

O numismata André Luiz Padilha, proprietário da Numismática Castro conseguiu uma resposta por e-mail do Gerente de Engenharia da Casa da Moeda do Brasil, à qual passamos a reproduzir na íntegra abaixo:


Número de Protocolo: 20170001732

Prezado Sr. André Luiz,

Antes que se inicie uma produção continua são adotados procedimentos de preparação os quais visam o cumprimento das exigências da especificação do produto (dimensional, profundidade de gravado etc). Entre as atividades que processo produtivo concentra encontra-se a montagem dos cunhos, o ajuste da força de cunhagem, a cunhagem preliminar de amostras bem como a subsequente verificação da formação dos gravados de anverso e reverso nessas amostras, o que permite ao operador de maneira direta constatar a qualidade e a conformidade dos relevos bem como a correta montagem de todo o sistema.

Há de se mencionar que além dos controles normatizados da qualidade, desde 2015 contamos com um avançado cofre automatizado de cunhos, o que inviabiliza a ocorrência citada em sua mensagem.

Já houve manifestação externa semelhante, também referente a era de 2008, da possível cunhagem de uma moeda de 50-5 centavos que, em teoria, poderia ser decorrente da congruência de uma série de fatores (proximidade dimensional de discos, troca de cunhos  etc), entretanto os artefatos não foram encontrados internamente.

Não há como afirmar que tal peça foi gerada em nossa linha de produção, continua, de grande escala, sendo recomendável não desconsiderar o seu forjamento externo.

Por fim, ressalta-se que a avaliação está restrita a imagem e para sua maior efetividade seria necessário estar de posse da moeda para a realização de análise junto ao laboratório.

Colocamo-nos a sua disposição para maiores esclarecimentos.


Alguém tem mais alguma dúvida acerca dessas peças bifaciais?


12 comentários:

  1. Até que fim alguém desvendou esse mistério, sempre desconfiei dessa moeda, parabéns pelo artigo.

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  2. Algumas perguntas
    - porque jogar a moeda ao chão, se poderia bater no centro na efígie, para deslocar o centro?
    - que tipo de solda usaria?
    - as ranhuras foram feitas depois da solda? Pois no corte poderia causar algum dano na ranhura pois sua expessura é de 1,95mm
    - e o peso, diâmetro e expessuras serem exatas a moedas cunhadas na CMB.
    - das apenas 10 moedas que ja ouvi e li, sua maioria foi encontrada circulando e não vendendo, para que ter tanto trabalho sem lucro?

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    1. Olha, fazer uma variante e por em circulação é a coisa mais fácil do mundo, eu já vi pessoas colocarem anel invertido em circulação das de um real. Primeiro, quem garante que as peças foram pegas em circulação? O atual dono que tá vendendo? Segundo, será que seriam cunhadas algumas dezenas, elas seriam vistas e não seriam descartadas? Caso passasse, teríamos muitas. Por que a casa da moeda não se pronunciou com as moedas de 0,50 com reverso de 0,5, nenhum catálogo sequer as cita. Provavelmente um anomalia de oficina mesmo e concordo com o Rubens.

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    2. Quanto ao peso, isso é fácil, vc desbasta as partes internas até as duas somadas terem o mesmo peso, junto com a soda, da moeda original.

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  3. Porque batendo no centro danificaria, criando uma depressão, jogando não haveria pressão maior em nenhum ponto.

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  4. É força de trabalho fazer estas moedas e soltar elas em estados diferentes PR, SP, RJ, MG. E serem vendidas por pessoas diferentes. Sobre a 0.50 foi analisada pelo BANCO CENTRAL e assumiram o erro pela quantidade. A minha moeda bi facial, já me prontifiquei em enviar para análise da Bentes e ela nem mesmo teve interesse. Para provar ser verdadeira ou não... então a única conclusão que tenho é " Se outros tem e eu não então é falsa "

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    1. Não costumo aprovar e nem responder comentários de quem se identifica apenas com apelidos, (“Genaro Genaro” não é nome de gente e sim de macarrão barato) mas vamos lá:
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      1) A moeda de 50 centavos "sem o zero" não tem nada a ver com as "bifaciais". O erro é completamente diferente e está explicado de forma muito clara neste blog. Há um post somente pra essa moeda, procure ler antes de vomitar bobagens. Nas moedas de 50 "sem o zero", foi inserido um cunho de 5 centavos na máquina que cunhava 50. O Banco Central reconheceu o erro por meio de nota oficial. Esse erro ocorre no mundo todo, e se chama “mule”. Nas bifaciais, teriam que ser 2 cunhos de anverso inseridos por erro, e isto é IMPOSSÍVEL, pois os encaixes de cunho de anverso e reverso são diferentes, já que um é fixo e o outro é móvel.
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      2) Não só o Bentes como qualquer outro numismata estudioso (que não seja apenas um mero comerciante) se recusaria inclusive a ver essas peças, pois já é de nosso conhecimento que, além da impossibilidade de existência de tal peça oriunda da Casa da Moeda, devido os encaixes dos cunhos serem diferentes, existem empresas chinesas que as fabricam sob demanda, bastando fazer o pedido (e este acreditamos ser o caso). Além de serem peças falsificadas, ainda incorre em crime federal de falsificação de moeda corrente. Nós inclusive sabemos quem são os marginais que desovaram essas peças e a denúncia já foi encaminhada à Polícia Federal.
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      3) Surgir moedas bifaciais em estados da federação diferentes não atesta originalidade das peças, somente prova que há uma quadrilha de vagabundos nos meios numismáticos. Simplesmente desovaram algumas peças no comércio, passando como mero troco do pão, pra serem encontradas pela população comum em algum tempo, numa tentativa de legitimizar a peça. Quanto à afirmação de que “os outros tem e eu não então é falsa” é ridícula. Tenho 2 exemplares, sendo uma de 1 Real e outra de 50 centavos, ambas claramente falsificações chinesas, além de mais outras 3 já terem passado por minhas mãos para análise. São todas falsificações e inclusive de qualidade inferior às originais. Até o momento NENHUM numismata sério atestou sua originalidade, somente leigos e comerciantes. Qualquer um que analise os cunhos com um microscópio e um programa de edição de imagens, perceberá que os desenhos dos cunhos possuem detalhes não encontrados em peças idênticas de mesma data (variante de cunho desconhecida).
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      Espero ter sido claro.

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  5. Entendo todos seus argumentos. E agradeço a todas respostas dadas como esclarecimento. Não desacreditado de minha moeda. Só lhe peço que edite sua última publicação onde diz sobre meu nome, pois não ofende somente a mim, mas aos meus pais ao qual ne deram este nome. Obrigado

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  6. Rubens, a carta diz que não pode afirmar sem a peça na mão, mas em um acerto de maquina, pode sim ter havido tal cambalacho.... Nunca a casa da moeda iria admitir a saída de uma peça estampada em um acerto de máquina.
    Por outro lado pode sim ser duas moedas usinadas e soldadas. Como não tenho a peça em mão, deixo aqui minha dúvida.

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  7. Pelas imagens, fato comprovado.... Com qualquer programa edição de imagem nota-se claramente, invertendo as cores, metais com coloração diferentes. moeda mostrada no vídeo foi manipulada.

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  8. E sempre existirão 2 pessoas para defender a "anomalia raríssima":
    O esperto que fabricou, E o otário que comprou!
    Kkk

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